John entrou a correr no quarto, ainda a vestir as últimas
peças do fato. Tinha chegado ali 20 minutos depois de receber uma chamada.
- Mike, o
que temos aqui? – Perguntou John.
- Ainda não
temos a certeza. Estamos a tentar abrir a tampa. – Respondeu Mike, enquanto
ajudava Thomas a desmontar a parte de cima daquela mala.
- Ok – disse
John -, e quanto tempo tenho?
- Quando
tirarmos a tampa, tens cerca de 5minutos. – Disse-lhe Thomas, olhando-o nos
olhos.
Mike e
Thomas estavam no 2º Departamento Antiterrorismo de Nova Iorque quando
receberam a primeira chamada desde há dois dias. Uma mala suspeita tinha sido
encontrada abandonada num hospital pediátrico. Era assim desde aquele fatídico dia
de 11 de setembro de 2001: as chamadas constantes, as suspeitas, as ameaças, o
pânico que se instalava, o medo. Meteram-se no carro e toda a equipa seguiu a
alta velocidade em direção ao hospital. Pelo caminho ligaram a John. Era ele o
perito, aquele a quem recorriam sempre, aquele que já por tantas vezes tinha salvado
inúmeras vidas. Era um herói incógnito para a cidade, para o país, para uma
nação, mas um super-herói para quem o conhecia.
A tampa
estava agora aberta, mostrando um engenho explosivo que nunca antes tinham
visto. Entreolharam-se como que a tentar perceber se alguém tinha aquela
expressão de quem sabe como resolver o problema, mas tudo o que encontraram foi
espanto e dúvida.
- Bem, não
interessa – disse John. – Vamos deitar mãos à obra! Mike, Thomas, vejam se há
fios que passem por detrás da mala e que liguem a algum sitio.
John
ajoelhou-se e olhou para aquele emaranhado de fios que saiam de uma caixa com
um pequeno mostrador numérico. Marcava 04:23 e descia a cada segundo que
passava. John já tinha desmantelado dezenas, para não dizer centenas, de
engenhos explosivos, uns com um simples movimento de um alicate, outros mais
complexos e mais demorados. Mas nunca tinha visto nada como esta. Alguém tinha
dedicado bastante tempo e esforço para fabricar uma bomba que tivesse grandes
probabilidades de explodir.
Sendo o
melhor da turma desde que tinha entrado para as forças especiais [aos 23 anos],
John tentava lembrar-se agora, a todo o custo, tudo o que tinha aprendido
durante a sua formação e os muitos anos de serviço. Rapidamente concluiu que
teria que usar a sua intuição, que já tantas vezes se tinha demonstrado acertada,
para resolver aquela situação.
- John –
disse Thomas, interrompendo-lhe os pensamentos -, está tudo estragado! Existe
uma ligação até à máquina dos snacks. Temos mesmo que a desmantelar aqui.
- Merda! Ao
menos o hospital já está todo evacuado? – Perguntou John.
-
Praticamente todo, faltam só alguns quartos da ala mais afastada daqui, mas
mais minuto, menos minuto, está completamente vazio. Quer dizer – disse Thomas,
olhando para ambos -, estamos cá nós.
O mostrador
marcava 03:11.
- Bem rapazes
– disse John -, hora de saírem daqui! Se eu não conseguir desmantelar isto
antes de faltarem apenas 45 segundos, saio daqui para fora também.
Thomas e
Mike fizeram um aceno com a cabeça e correram pelo corredor em diração à
segurança. John estava agora completamente sozinho e era assim que gostava de
trabalhar. Precisava de silêncio, de ouvir única e exclusivamente o que a bomba
lhe dizia, como o seu corpo reagia a esses sons. Enquanto dava voltas aos fios,
os seus pensamentos, a par de estarem centrados no que fazia, divagavam por
outros caminhos: quem é que poderia ter uma mente tão perturbada que quisesse
matar inocentes? Ainda por cima, crianças! Ele até compreendia que os tentassem
matar a eles, que atentassem contra o governo, contra militares, mas por muito
que tentasse, não conseguia encontrar uma explicação para um ato destes.
Cortou um
fio, mas o relógio continuou a sua contagem decrescente como se aquele fio
tivesse sido ali posto só para criar uma falsa esperança. Marcava 01:50.
Tinha pouco mais de 1 minuto para a conseguir desactivar antes de ter que sair
à pressa. Concentrou-se ainda mais em toda a complexidade daquele engenho. Queria vencê-lo, derrubá-lo, poder rir-se na sua cara e saber que tinha
impedido a destruição do edifício e de possíveis vidas humanas. Apesar de tudo,
não podia ficar indiferente a ela. Era, de facto, uma bomba completamente
invulgar. Uma obra prima para quem a construiu, o maior desafio de sempre para
John.
00:56
Tinha que
tomar agora uma decisão. Desistir e correr dali, ou continuar a tentar e ficar
sem tempo para fugir. A muito custo, deu-se por vencido e levantou-se do chão.
- John!
Estás a ouvir John? – Gritava Thomas pelo intercomunicador. – Ainda está uma criança
no edifício! Como está isso por aí?
John ficara
estático ao ouvir aquilo. Não podia sair dali sabendo que uma criança andava
por ali, possivelmente perdida e cheia de medo. Tinha que ficar!
- Encontrem essa criança! Eu vou ficar! - Respondeu apressadamente.
- Mas isso é loucura!
- A minha decisão está tomada. Encontrem-na! - E desligou o intercomunicador.
Tirou a
máscara, as luvas, e despiu o fato protector, que ele sabia agora, não lhe ir
valer de nada caso não desativasse a bomba a tempo. Debruçou-se de novo sobre
ela, olhando de perto, desviando fios, passando a mão pelo metal frio da
guarnição dos explosivos.
00:17
Corta um fio
e a contagem para. Tinha conseguido, tinha vencido, todos podiam descansar.
Sorria agora, um sorriso de verdadeira felicidade. Limpou a testa, alagada em
suor que lhe escorria pela cara abaixo, pingando o chão e entrando-lhe para a
boca. Conseguia sentir o seu sabor salgado. Olhou pela janela, para as nuvens
brancas que pontuavam um céu azul intenso e pensou que naquela noite ainda iria
abraçar a sua filha bebé, que ainda iria fazer amor com a sua mulher. Voltou a
olhar para o mostrador e o sorriso desapareceu imediatamente. O cronómetro
estava de novo em contagem decrescente. John não perdeu tempo a agarrar no
alicate de corte e olhar de novo para os fios. O suor entrava-lhe agora pelos
olhos, dificultando-lhe a visão. Tinha apenas 3 fios ligados ao relógio. Tinha
que tomar uma decisão rápida, tinha que conseguir!
00:03
Lembrou-se
que lhe tinham dito que no momento que uma pessoa sabe que vai morrer, que a
sua vida lhe passa à frente dos olhos como se fosse um filme. John viu o seu
pai a ensinar-lhe a jogar beisebol no quintal de sua casa; viu a sua mãe a preparar
tartes de maçã, a assar perú, a dar-lhe aulas em casa; viu o seu irmão a partir
para o Iraque em mais uma missão. Lembrou-se que já não o via há cerca de 7
meses e de como tinha saudades dele; viu a sua mulher Katherine a dar à luz a
sua filha Denise; viu a sua filha a fazer o seu primeiro aniversário, a ir pela
primeira vez para a escola, a chorar o primeiro desgosto de amor, a felicitá-la
na sua graduação, a levá-la ao altar; viu os seus netos; viu que possivelmente
não iria ver nada disto. Esperou que, pelo menos, a criança tivesse sido
encontrada.
00:01
Uma decisão
tinha que ser tomada, um fio tinha que ser cortado. Mudou rapidamente o alicate
para o lado esquerdo e cortou o fio azul.
Depois, foi o silêncio total.
Depois, foi o silêncio total.
E por toda a
cidade se ouviu uma enorme explosão.
(Aceitando o desafio da Liz, que consiste no seguinte: "Imaginar que é um especialista em minas e armadilhas e tem de desmontar
uma bomba relógio em 5 minutos. Está num hospital e em jogo estão todas
essas vidas. Descreva a situação num breve parágrafo do ponto de vista
do especialista, transmitindo a aflição do narrador em primeira pessoa." - Não segui o desafio à regra, para melhor se adaptar ao meu estilo. Quem quiser levar o desafio, está à vontade! Liz, espero não ter desiludido! :D )
Hummmm.... triste.... :(
ResponderEliminarPode ser que a criança se tenha salvado.. :)
EliminarSalvou-se? Menos mal...
EliminarMais uma morte!! Tu andas a matar gente à força toda homem!!! Mas muito bem escrito, as always :) capaz de prender a atenção de tal forma que devia estar a trabalhar mas tinha de saber se o John conseguia desmantelar a bomba!!
ResponderEliminarNão pode ser sempre histórias com finais felizes e amorosos. De vez em quando também é bom sabermos que pode correr mal.
EliminarE muito obrigado! :D
Clap, clap, clap...mesmo com a morte!
ResponderEliminarObrigado! A morte aqui, era inevitável. :)
Eliminar"Era ele o perito, aquele a quem recorriam sempre, aquele que já por tantas vezes tinha salvado inúmeras vidas." - porquê tinha salvado e não tinha salvo?
ResponderEliminarEu gostei... Foi daqueles que me fazia descer os olhos mais abaixo no texto para saber se explodia ou não :$ ahah
Para responder à tua pergunta, segue link com simples explicação. caso não queiras abrir o link, certos verbos têm dois participios, neste caso, "salvar" tem o "salvado" e o "salvo", sendo que com o verbo auxiliar ter e haver, usas o prolongado "salvado". Com o verbo ser e estar, usas o mais pequeno. :)
Eliminarhttp://www2.tvcultura.com.br/aloescola/linguaportuguesa/morfologia/verbos-participio-entregue-entregado.htm
Tentei guardar o final mesmo até ao fim. No ultimo segundo podia ter cortado o fio certo.. não foi o caso.. ;)
Obrigado pela explicação - continuo a achar que não soa nada bem xD
EliminarE tu não andas muito assassino nem nada? O.o
Como é que dizes?
Eliminar1- O João é mais bem remunerado.
2- O João é melhor remunerado.
Às vezes, nem sempre o que soa melhor, é o mais correto. ;)
Epá, não pode ser só corações.. :)
Eu digo que o João é melhor remunerado que o Zé. Mais bem não me soa bem.
EliminarTodo ele estava num pulsar desenfreado! Com aquilo na mão pronto para rebentar a qualquer momento; de repente nos sucessivos pensamentos acontece o êxtase final. Isto mais parece que o John estava numa casa de banho publica.
Eliminarmas é "mais bem" que se diz.. :) o "melhor" não está totalmente errado, mas o correto é a opção 1.
EliminarAqui a explicação de novo: http://emportuguescorrecto.blogs.sapo.pt/33536.html
Anónimo/a, alguém tem uma mente ainda mais perversa do que a minha.. :D
Mais bem é como mais maior. Não entra na minha maneira de escrever, falar, fazer-me entender. Lamento :D
EliminarSim, acredito nisso, às vezes soa esquisito, mas é assim a nossa lingua. Mas como também não aderiste ao AO, eu perdôo-te, tal como tu perdoas os meus "há" e "à" e os "-te" e os "te" nos sitios errados! :D
EliminarEstamos perdoados :p
EliminarMustache onde é que tu vais buscar a imaginação???
ResponderEliminarA ideia da bomba surge de um desafio de escrita. Depois, foi pensar na situação.
EliminarE vocês não vão querer saber como é o meu processo criativo! haha
Mataste o John??? Eu até gosto de finais tristes, finais felizes sempre tornam-se aborrecidos.
ResponderEliminarNeste ainda estou a pensar se gostei do fim, mas é uma boa história :) Até tens jeitinho :D
Teve que ser, não quero cá heróis vivos no meu blog sem ser a minha pessoa! :D
EliminarOk, pensa e depois diz-me se preferias outro final, ou este final mas contado de outra forma.. :)
E obrigado! :)
Egoísta! Só tu é que podes ser herói?
EliminarAcho que não gostei do fim porque começaste para aí a falar da mulher do John e da filha do John e do que ele não ia viver se morresse e isso fez-me ter pena do homem. Mas criaste emoção e só por isso já valeu e pena :)
A história é tua, o fim é teu :D
E depois do Mustache ter andado pela Blogosfera a fazer birra eis que aqui me encontro!
ResponderEliminarGostei. Está longo como disseste mas essa já é a tua imagem de marca! O que estava proposto está aqui: sensação de urgência, emergência, medo, expectativa e finalização. Mas mataste o John....a man gotta do what a man gotta do ;)
Gostei
Diz lá que eu não saí um chorão do pior?! :D
EliminarMas queria mesmo que visses, e acho que só fiz birra em 10 ou 11 blogs onde tu vais.. :)
Ainda bem que passei no teste. Agora é agarrar-me aos outros desafios! :)
Obrigado Lizinha de mi corazon!