terça-feira, 22 de outubro de 2013

Texto 6..


Somos seres sem vida, veem-nos sem vida, sabendo que encerramos, dentro de nós, inúmeras vidas. Olham para nós com o ímpeto de relegarem as suas próprias vivências e poderem viver toda uma história diferente, poder viver o sonho consciente ou inconsciente de uma existência paralela.

Somos seres sem vida, inanimados, adormecidos, à espera que nos toquem da forma certa, da forma delicada, tão delicada como os movimentos ondulantes e hipnotizantes do maestro que coordena a sua orquestra. E os nossos braços, as nossas pernas, os nossos apêndices começam a sua dança, o seu andamento, ao ritmo da destreza de quem nos conduz, de quem quer ser transportado para longe das vicissitudes do dia a dia.

Somos seres sem vida, imaculados, virgens. Esperamos para ser tatuados, para sermos transformados, para que nos marquem o corpo, sabendo que iremos marcar uma alma. Esperamos para ser tatuados com vida, para que nos nossos corpos se desenhem testemunhos. Só nos nossos corpos faz sentido marcar presença, guardar segredos, relatar vidas vividas longe no tempo. Somos o grito silencioso de quem nos tatuou com o crer de que serão ouvidos, quando para nós olharem.

Somos seres sem vida, esquecidos, abandonados. Não sem antes deixarmos a nossa marca, o nosso rasto, na vida daqueles que um dia ousaram olhar para nós. E não nos contemos em revelar os segredos que em nós depositaram, as fantasias que em nós descreveram, as vidas que em nós foram vividas. Quando somos seres olhados, escancaramos os nossos braços, abrimos a nossa boca, esvaziamos os pulmões, tal a vontade de contarmos qualquer coisa da vida.

Somos seres olhados, somos seres com vida, com vidas. No branco do nosso corpo temos traços tatuadas a tinta de caneta, a carvão de lápis; temos as marcas de quem em nós pegou e nos vincou, de quem de nós extraiu uma nova vida. Há quem nos chame de contadores de histórias, há quem nos chame de livros, mas mais não somos do que, e apenas, seres olhados.

2 comentários:

  1. Anónimo11:33:00

    Está visto que não percebo nada disto porque gosto mais do teu do que do vencedor!

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Dá a tua aparadela..