terça-feira, 29 de outubro de 2013

Texto 7..



Distraído como ia a mexer no telemóvel, assustei-me quando senti alguém a aproximar-se de mim em sentido contrário. Num pequeno movimento de corpo, desviei-me e vi apenas de relance a pessoa que por mim passou. Este olhar não durou mais do que um piscar de olhos, mas foi o suficiente para que todo o meu cérebro entrasse em sinapses eletrizantes ao vê-la.

Ar radiante e decidido. Uma mulher que sabe o que faz e quer. Saia e casaco, collant de vidro e sapato alto, tudo combinado na mais plena harmonia para cobrir um corpo perfeito. Um corpo de proporções certas: um peito saliente, uma cintura fina de contornos delicados e umas pernas longas – ainda mais longas devido aos saltos. Os seus cabelos eram escuros e lisos, caindo-lhe pelo pescoço até chegarem aos ombros. Ao pescoço um simples fio com um “M” como pendente. Margarida? Maria? Marta? Não importa! Mais do que um possível nome o que despertou as conexões neurológicas foi a sua expressão, a sua determinação. Como poderia tanta confiança estar confinada num rosto tão belo e frágil? Uns olhos verdes e brilhantes, uma boca de lábios bem vermelhos, entreaberta num sorriso, era a janela para uns dentes brancos – mais brancos que o leite.

Imediatamente, associei aquela mulher a alguém de sucesso, a alguém que vingou na vida, não sem antes ter provado o travo amargo do assédio masculino, da inveja feminina e do desprezo da vida. Mas, hoje, é este portento de mulher. Aquela que chega a casa e troca o fato e os sapatos pelo avental e pelas pantufas, que troca a maquilhagem pelos riscos feitos pelos filhos e que troca o perfume de marca pelo cheiro deixado no ar pela refeição que prepara para a família. E tudo isto sem nunca deixar cair aquele sorriso ou perder o brilho do olhar.

Senti-me quase obrigado a virar-me para trás para a olhar de novo e, quem sabe, falar com aquela mulher que em tudo me fez ver aquilo que sou hoje. Olhei e vi uma rua completamente deserta, ocupada apenas por um objeto grande e fino encostado a um poste. Intrigado, contornei-o e fiquei de frente para ele. Não consegui não sorrir. Um enorme espelho reflectia a minha imagem, desta vez, a certa.

1 comentário:

  1. Anónimo13:07:00

    O júri não percebe nada disto!!! E tenho dito!!!!

    ResponderEliminar

Dá a tua aparadela..